Gestão baseada em promessas
5 de fevereiro de 2019A solidão do poder
5 de fevereiro de 2019Ao atacar – ponto por ponto – as fraquezas dos concorrentes e copiar o que eles tinham de melhor, a Springer saiu do buraco para voltar à liderança
Poucas empresas instaladas no Brasil sentiram tanto o impacto da concorrência chinesa como a Springer Carrier, maior fabricante de aparelhos de ar-condicionado do mundo e líder nacional do setor. Em apenas dois anos, entre 2004 e 2006, sua participação de mercado caiu de 31% para 25%. As desvantagens competitivas da Springer eram enormes. Os produtos fabricados na China desembarcavam no Brasil custando apenas 40% do valor dos aparelhos produzidos pela empresa. Além disso, os chineses passaram a trazer modelos inovadores, como os do tipo split, que caíram nas graças dos consumidores. A situação passou a beirar o desastre quando a Springer Carrier adotou uma estratégia atastrófíca para diminuir o impacto da invasão chinesa. Apesar da desvalorização acelerada do dólar, seus executivos decidiram aumentar o peso das exportações nas contas da filial brasileira — que passaram de 25% do faturamento em 2004 para 35% em 2005. O impacto nas finanças foi devastador. O lucro caiu de 45 milhões de reais para 8 milhões e a Springer se endividou em 110 milhões de reais. Em meio a esse cenário sombrio, a matriz, sediada no estado de Connecticut, nos Estados Unidos, designou o argentino Roberto Fernandez para deter a sangria. Até então responsável pelas operações do grupo no Cone Sul, Fernandez veio com a missão de colocar a operação brasileira no prumo — o que conseguiu em menos de um ano.
As medidas que Fernandez adotou para reverter a situação, a partir de 2006, resultaram em um caso de sucesso que passou a ser conhecido no grupo Springer como Brazil turn around (A virada do Brasil). A primeira providência foi fazer um levantamento minucioso das deficiências e dos pontos fortes dos chineses — e atacá-los um a um. Após a implementação da estratégia, a subsidiária brasileira zerou sua dívida, recuperou o espaço perdido e deve fechar este ano com 29% de participação de mercado, quase o mesmo percentual que tinha antes da chegada dos chineses. Seus números hoje são melhores do que antes. O faturamento previsto para este ano, de 700 milhões de reais, é 12% maior que o registrado em 2006. A projeção de lucro, estimada em 50 milhões de reais, também subiu: é cerca de 60% superior à do ano passado. “Foi basicamente uma correção de rumo”, diz Fernandez. “A empresa era como um barco a vela em meio a uma súbita mudança de vento. Só que quem estava dentro dele não percebia o que acontecia em volta. Mudamos a posição da vela para voltar a navegar.” Inovação e design tornaram-se as prioridades dentro da Springer. A companhia contratou novos profissionais e recorreu a outras subsidiárias do grupo em busca das melhores tecnologias disponíveis. O objetivo era fabricar por aqui produtos mais silenciosos, menores e que consumissem menos energia do que os dos rivais chineses. Ao mesmo tempo que seus engenheiros adaptavam a linha de produtos, a Springer Carrier negociava a redução de preços de matérias-primas com todos os fornecedores locais. Cerca de 70% deles conseguiram baixar custos. Os outros 30% foram substituídos por fornecedores asiáticos. Com a medida, os preços dos produtos tiveram redução de quase 10%. Em outra frente, a empresa investiu em atendimento — uma das maiores fragilidades dos produtos chineses no Brasil. A maioria deles chega ao mercado brasileiro por meio de importadoras que, em geral, não oferecem assistência técnica aos produtos. A companhia colocou vendedores nas principais redes de varejo do país, cadastrou 200 centros de serviço autorizado e criou cinco centros de distribuição de peças em pontos-chave do território nacional. “Em alguns segmentos, como o de aparelhos de ar condicionado, agregar serviços é uma forma eficaz de competir com chineses”, diz Eugênio Foganholo, consultor de varejo.
Com a reviravolta, a Springer Carrier do Brasil passa a fazer parte de um ainda pequeno grupo de empresas que — cada uma à sua maneira — conseguiu não só sobreviver à ameaça asiática como superá-la. No setor de calçados, uma das mais afetadas pela concorrência brutal das fábricas da China, a Vulcabras, de Pedro Grendene, partiu para uma agressiva política de aquisições e triplicou de tamanho em apenas dois meses. Em junho, adquiriu a argentina Gatic por 60 milhões de dólares e no mês seguinte comprou a Azaléia por 350 milhões de reais. Como resultado, transformou-se na maior fabricante de calcados do país, com previsão de faturamento de 1,8 bilhão de reais para 2007. Gigantes como Coteminas e Santista optaram por fusões com grandes empresas que também eram afetadas pela concorrência chinesa nos países desenvolvidos e tornaram-se corpulentas o suficiente para se manter como negócios relevantes no cenário global. No setor de brinquedos, as empresas que apresentam melhor desempenho são justamente as que encomendam diretamente às fábricas chinesas seus produtos. Como diz Jack Welch, o ícone do mundo dos negócios e colunista de EXAME, não existe uma fórmula pronta para lidar com os chineses — apenas a certeza de que esse é um problema inevitável.
Contra-ataque em 5 passos
Para vencer os chineses, a operação brasileira da Springer Carrier realizou mudanças em várias frentes diferentes — do design dos produtos ao pós-venda.
1- Os fornecedores locais foram trocados por empresas asiáticas.
2- A companhia investiu no desenvolvimento de novos produtos, buscando aparelhos mais silenciosos e econômicos.
3- Todos os modelos foram redesenhados e modernizados, ganhando linhas mais arrojadas e novas cores.
4- Os vendedores receberam treinamento intensivo para comunicar a mudança aos clientes.
5- A rede de distribuição de peças foi ampliada. Além disso, foi criado um call center para reforçar o pós-venda.
Fonte: REVISTA EXAME – 19/12/2010 – Pág.72 a 73.