Como tomar a melhor decisão?
5 de fevereiro de 2019
O perfil do executivo brasileiro
5 de fevereiro de 2019
Como tomar a melhor decisão?
5 de fevereiro de 2019
O perfil do executivo brasileiro
5 de fevereiro de 2019

Qual a melhor estratégia para coordenar o trabalho de funcionários criativos? É verdade que ela deve ser diferente daquela aplicada aos demais profissionais?

Administrar funcionários criativos, que geralmente não vêem a si mesmos como empregados de nin­guém ou de coisa alguma — muito me­nos se consideram subalternos incrusta­dos em uma organização estruturada em níveis, camadas e em patamares móveis —, é algo tão distante do bê-á-bá da ad­ministração quanto se possa imaginar. Li­dar com esse pessoal é uma arte. Requer todo tipo de habilidade diplomática: empatia, cultivo de um bom relacionamento e até aconselhamento psicológico quando necessário. Seria um grande erro, porém, liderar essas pessoas com o coração e sim­plesmente parar por aí.

Administrar indivíduos criativos tam­bém requer — ou melhor, exige — uma dose de autoridade. Nada muito exagera­do, é claro. Você não vai querer que essas pessoas fora do comum procurem a por­ta da saída. Com suas ideias arejadas e perspectivas privilegiadas, elas costumam ser responsáveis por produtos revolucio­nários, por novas formas de execução de trabalhos diversos e até mesmo pelo im­pulso necessário à criação de negócios to­talmente novos.

Contudo, essas pessoas criativas preci­sam saber que há limites e valores a ser observados —,e é imprescindível que elas os observem. Caso contrário, acabarão saindo dos trilhos e levando de roldão ele­mentos essenciais do dia-a-dia da empre­sa. Sabemos perfeitamente que esse “ta­pa com luva de pelica” é, de certo modo, oposto ao que tradicionalmente se ensina por aí sobre o gerenciamento de pessoas criativas. Normalmente, a recomendação é que escritores, editores, artistas, projetistas de software, engenheiros, pesquisadores científicos e até mesmo alguns pou­cos banqueiros de investimento particu­larmente criativos sejam deixados a sós para que trabalhem livremente. Reza a opi­nião geral que essa turma é diferente de você e de nós — são seres mais profun­dos, de estrutura mais misteriosa e muito frágeis. Se tratá-los como abelhas operá­rias, seu retorno será pífio. Se tratá-los co­mo Yodas (o sábio de Guerra nas Estre­las), sua sabedoria fluirá.

Nossa vontade é de pôr abaixo tudo isso como mera tolice, mas o fato é que há um grão de verdade aí. As pessoas mais criativas geralmente têm um intelecto rnais complexo e um lado emocional mais delicado. Às vezes são excêntricas ou ar­rogantes. Algumas são anti-sociais. Mui­tas delas passaram a odiar o status quo na escola e jamais deixaram de odiá-lo. Talvez esses traços sejam consequência da forma como seu cérebro funciona ou da anuência da maior parte da socieda­de. Seja como for, indivíduos verdadei­ramente criativos parecem se retrair sem­pre que são obrigados a adequar-se a es­truturas normais.

Acontece, porém, que as empresas não são museus. Elas não existem para exibir o produto da criatividade de alguém, mas para tirar proveito dela. E para que isso possa acontecer é preciso mudar a ideia profundamente arraigada no indivíduo criativo de que ele é um agente livre. É como disse certa vez a um de nós um funcionário criativo — um autor brilhante que sem­pre “estourava” os prazos sem remorso al­gum. Ele dizia: “Você não é meu chefe”. Do ponto de vista técnico, ele estava re­dondamente enganado, mas sua cabeça lhe dizia o contrário.

Muitos indivíduos criativos acatam princípios e procedimentos organizacio­nais básicos. Eles forçam os limites mas não os ultrapassam e, como consequên­cia disso, suas equipes e as empresas on­de trabalham prosperam. Noutras vezes, porém, as empresas contam com tipos criativos de tal forma talentosos que seu comportamento rebelde acaba sendo to­lerado, como no caso do cientista brilhan­te que trata seus companheiros como es­cravos; ou do diretor de arte que faz pou­co dos apelos da empresa para que corte custos; ou, ainda, do projetista genial de videogames que se recusa a falar com o departamento de marketing.

Essas atitudes são, sem dúvida algu­ma, abusivas. Mas, quando o indivíduo criativo que manifesta esse tipo de com­portamento é excepcionalmente bom, o executivo a quem ele se reporta finge que não vê. Quem está disposto a sacrificar a galinha dos ovos de ouro? O problema, porém, é que os comportamentos negati­vos costumam se espalhar. As pessoas de­cidem começar a trabalhar quando e on­de querem — o que, normalmente, signi­fica que trabalharão sozinhas. Elas dei­xam de compartilhar ideias com os “me­nos capacitados”. Muitas vezes, criticam umas às outras com ironia por causa de suas diferenças criativas.

Tal liberdade pode ser um alívio e até mesmo uma emoção para o funcionário criativo que pode desfrutar dela. No en­tanto, é uma verdadeira agonia para os funcionários “comuns”, que começam a se sentir estranhos no ninho. “Por que es­se pessoal criativo tem tanta mordomia e nós não temos nenhuma?”, eles se per­guntam. Esse tipo de questão só pode le­var o ambiente ao caos ou a uma espécie de beco sem saída.

Para vencer, é fundamental que uma empresa tenha executivos que respeitem a individualidade das pessoas criativas — elas são realmente diferentes. Contudo, para que uma empresa seja unida e pros­pere, é preciso certificar-se de que esse pessoal mantenha suas particularidades dentro dos limites.

É claro que haverá quem se recuse a aceitar tais restrições. Haverá até mesmo quem decida deixar a empresa. Lembre-se, porém, de que você é o chefe deles — e dos demais funcionários também. Pelo bem da empresa, aja como tal.

Fonte: REVISTA EXAME – 10/10/2010 – Pág. 192 a 193.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *