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A essência da execução

Donald N. Sull e Charles Spinosa

Um gestor possui um sortimento completo de ferramentas para converter a estratégia em ação. Pode recon­figurar o organograma, reformular processos de negócios, realinhar incentivos ao pessoal ou montar sistemas sofisticados de TI para monitorar o desempenho. Ainda assim, iniciativas críticas empacam e tarefas importantes não são cumpridas. Novas oportunidades de negócios escorrem pelos dedos ou, pior até, vão parar nas mãos de concorrentes mais ágeis.

A execução malogra por vários motivos, todos de depri­mente familiaridade: funcionários perdem motivação por discordar das prioridades da empresa; sua satisfação e produtividade caem. Silos funcionais dificultam a coordenação exigida para que a empresa agarre novas oportunidades. A organização em estruturas matriciais turva a responsabi­lidade por projetos e iniciativas. Aliás, a execução fica parti­cularmente difícil quando o executivo precisa administrar atividades não só de subordinados diretos, mas também de uma rede tentacular de fornecedores, parceiros, trabalha­dores do conhecimento e colegas espalhados pelo mundo.

É impossível superar esses e outros entraves à execução com as mesmas fórmulas de sempre. O executivo deve, isso sim, repensar fundamentalmente o modo como é feito o trabalho. Deve entender, mais especificamente, que a empresa é mais do que um aglomerado de processos ou uma série de quadradinhos e linhas no organograma. Toda em­presa é, no fundo, uma rede dinâmica de promessas. Funcionários de todos os escalões se comprometem uns com os outros — a típica gestão por objetivos. Assumem, ainda, compromissos com colegas de outras divisões e com clientes, parceiros externos, outras partes interessadas. Cada promessa é um fio na trama da atividade coordenada de uma organização.

A maioria dos grandes desafios de um líder — execução inadequada da estratégia, falta de agilidade organizacional, baixo envolvimento do pessoal e por aí vai — nasce de compromissos rompidos ou mal formulados. Para superar alguns dos problemas mais espinhosos no curto prazo e cultivar uma força de trabalho produtiva e confiável no longo prazo o executivo deve praticar o que chamamos de “gestão baseada em promessas”: o cultivo e a coordenação de compromissos de modo sistemático.

Por que promessas? E por que agora?

A gestão baseada em promessas é um novo capítulo em uma tradição que remonta, no mínimo, ao surgimento do direito contratual no Império Romano. Explora preceitos da teoria dos atos de fala, ramo da filosofia da linguagem que busca en­tender como o indivíduo se compromete a agir por meio de afirmações, perguntas, pedidos, promessas, declarações e ou­tros atos de fala. A gestão baseada em promessas é parti­cularmente relevante para o executivo de hoje — que, cada vez mais, se especializa no core business, desfaz-se de ativos marginais e terceiriza atividades periféricas. Além disso, ajuda o gestor a capitalizar oportunidades alheias a sua capacitação central e a envolver e segurar talentos em uma força de trabalho altamente móvel. Examinemos cada de­safio desses isoladamente.

Aumentar coordenação e colaboração

Para o gestor, é relativamente simples levar algo a cabo quando o pessoal e os recursos relevantes pertencem a uma mesma divisão contábil ou funcional. Nesse caso a hierarquia é clara e o poder posicional leva o indivíduo a honrar suas promessas — pois o chefe dispensa incentivos e castigos. Mas a tendência à es­pecialização nas empresas foi constante nos últimos anos. O gestor pena para executar algo em organizações matriciais ou redes de empresas frouxamente unidas quando aqueles de quem depende não compartem suas premissas ou obje­tivos. Para o cientista de um laboratório farmacêutico o su­cesso pode ser um medicamento revolucionário fruto do esforço de décadas. Já o representante de vendas externo estaria pensando apenas no total de unidades vendidas no curto prazo, raramente indo além da cota do trimestre se­guinte. Promessas bem feitas podem estreitar o vão entre os dois — talvez separados, nos sentidos literal e figurado, por grandes distâncias. Os diálogos centrais à gestão baseada em promessas permitem a indivíduos de origens distintas chegar a uma noção comum sobre o que é preciso fazer. Promessas fomentam, ainda, um senso mútuo de obrigação pessoal para com o compromisso assumido.

Aumentar agilidade

Empresas com processos bastante azeitados geralmente se saem bem na execução de ativida­des rotineiras, de alto volume. No entanto, esses mesmos processos podem impedir a empresa de tirar proveito de oportunidades sem ligação com seus recursos centrais — entrar em um mercado emergente, digamos, implementar um sistema de TI em larga escala ou administrar um ecossistema de parceiros para gerar e obter valor. A própria pa­dronização por trás do progresso contínuo de processos tradicionais de negócios reduz a flexibilidade — e agilidade é importante. Em uma sondagem recente da McKinsey so­bre organizações ágeis, 89% dos mais de 1.500 gestores ou­vidos mundo afora classificaram a agilidade como “muito” ou “extremamente” importante para o sucesso de sua em­presa — e 91% disseram que tal importância aumentara nos últimos cinco anos. A gestão baseada em promessas pode ajudar a organização a agir com mais rapidez e flexi­bilidade. Ao buscar ajuda para um projeto ou iniciativa, por exemplo, o pessoal pode lançar longe a rede, dentro e fora da organização, para achar a pessoa certa para a tarefa. Ca­da um dos envolvidos na promessa pode estabelecer condições ajustadas a suas circunstâncias e renegociar à medida que surgem novas informações ou mudam as prioridades — algo muito menos problemático do que reestruturar um processo bem estabelecido. Já que ambos os lados aceitaram de livre e espontânea vontade o compromisso — e co­locaram sua reputação em jogo —, a tendência é que ajam de modo expedito e disciplinado.

Aumentar envolvimento do pessoal

Muitos executivos tentam domar a fragmentada força de trabalho de hoje com processos rígidos que tolhem a iniciativa e o envolvi­mento do pessoal. Já organizações que engendram promes­sas confiáveis e bem feitas criam um senso de comunidade entre os trabalhadores — ou seja, a pessoa promete agir porque crê na missão e nas prioridades gerais da empresa e sabe que papel exerce para sua consecução. A gestão ba­seada em promessas dá ao indivíduo poder para agir como um empreendedor na organização — poder para detectar oportunidades, para reunir recursos necessários à explo­ração dessas oportunidades e para se ajustar a novos fatos. Dentro dos limites dos objetivos da empresa, o funcionário pode controlar e tocar a própria rede de promessas. Esse senso de controle, aliado a uma grande latitude na gestão de negociações em torno de cada promessa, aumenta dras­ticamente o envolvimento do pessoal e, conseqüentemente, o desempenho geral.

Embora vitais para o sucesso da empresa, muitas pro­messas acabam naufragando na prática. Em grande medi­da, o colapso ocorre porque gerentes e funcionários têm uma noção imperfeita de como assumir um compromisso efetivo.

Conversa para o compromisso

Uma promessa é a obrigação que o provedor assume de aten­der à solicitação de um cliente dentro ou fora da organi­zação. Aqui, os termos “cliente” e “provedor” se referem a papéis, não a indivíduos — papéis que podem variar depen­dendo da situação. O diretor de informação, por exemplo, é um cliente ao solicitar dados financeiros do diretor de fi­nanças ou buscar o compromisso de um subordinado. Mas é provedor ao dar suporte técnico ao financeiro ou fazer promessas a seu superior.

Uma promessa raramente ocorre em isolamento: para honrá-la, o provedor deve tecer e monitorar uma rede de compromissos correlatos de colegas, subordinados, parcei­ros, fornecedores e por aí afora. A necessidade de compor essa trama de promessas torna muito mais complexa, para o provedor, a tarefa de cumprir a palavra e sublinha a im­portância de uma gestão eficaz de compromissos.

A promessa muitas vezes é encarada sob um viés legalis­ta e definida à luz dos termos do acordo — postura similar à do advogado que foca cláusulas específicas de um contra­to. Mais importantes do que o conteúdo expresso da promessa, contudo, são as discussões que lhe dão vida. Ambos os lados devem definir explicitamente o que o cliente quer e por que o quer, o que o provedor fará para atender ao pe­dido e entraves ou prioridades conflitantes que dificulta­riam o cumprimento da promessa.

Cliente e provedor devem percorrer rigorosamente três fases de discussão para formular e executar a contento uma promessa. A primeira é chegar a um acordo, o que é mais fácil na teoria do que na prática. Essa fase em geral começa quando o cliente pede algo ao provedor. Cada lado terá uma opinião distinta sobre o que deve ser feito para atender ao pedido, o porquê, a rapidez com que isso pode ocorrer, os recursos a serem utilizados. Devido a visões de mundo divergentes — entre divisões, empresas, países e idiomas —, é comum as pessoas não falarem a mesma língua. Cliente e provedor devem, portanto, sentar e explorar as questões fundamentais do esforço coordena­do: o que você quer dizer? Você entende o que quero dizer? O que devo fazer? O que você fará? Com quem mais devemos falar?

Cliente e provedor devem fazer o possível para chegar a uma noção comum e realista sobre o que será preciso para satisfazer o cliente, possíveis obstáculos no caminho e que ajuda o cliente pode dar caso surjam dificuldades ou ou­tras prioridades venham disputar o tempo e a atenção do provedor. Essa fase da discussão acaba quando o provedor faz uma promessa que o cliente aceita.

Na fase seguinte — cumprir a obrigação — o provedor executa o prometido. Independentemente do que o prove­dor possa achar, esse não é o momento de tirar o telefone do gancho. Conversar é mais importante do que nunca. Até a promessa bem formulada segue frágil e suscetível a mudanças na organização ou no cenário maior de negó­cios — mudanças que levariam executivos a redefinir prioridades e realocar recursos. À luz dessas alterações o cliente e o provedor terão de continuar interpretando e reinterpretando a promessa. Com efeito, se perceber que será incapaz de honrar o compromisso assumido com o cliente, o provedor deve renegociar prontamente os ter­mos do pacto. O cliente também tem o dever de buscar a renegociação caso suas prioridades ou circunstâncias mu­dem e afetem aquilo que solicitou ao provedor. Essa fase termina quando o provedor declara concluída a tarefa e submete o resultado à avaliação do cliente.

Na última fase — fechar o círculo — o cliente declara publicamente que o provedor cumpriu (ou não) o prome­tido. Ao fecharem o círculo, cliente e provedor têm a opor­tunidade de dar, um ao outro, sua opinião sobre o que tornaria a colaboração mais eficaz no futuro. Isso gera um avanço contínuo na qualidade das promessas feitas.

Observe que cliente e provedor devem chegar não só a um acordo, mas também a um propósito comum. Um pro­vedor pode hesitar em assumir um compromisso por bons motivos — como manter suas opções abertas e proteger sua reputação de cumpridor de promessas. É crucial que a discussão sobre o que fazer ande de mãos dadas com a discussão sobre a importância disso para ambos os lados. No afã de desincumbir-se logo da tarefa, muitos gerentes travam na correria esses importantes diálogos ou simples­mente os ignoram.

Cinco características de uma boa promessa

Em mais de uma década de pesquisa sobre compromissos, pedimos a centenas de gestores que avaliassem a qualidade das promessas feitas em sua organização. Queríamos saber que parcela dos compromissos com eles assumidos era real­mente cumprida. A resposta típica era cerca de 50%. Quando a promessa não é confiável, o gerente perde um bocado de tempo conferindo seu progresso, exercendo pressão política ou duplicando o trabalho — com prejuízo para a eficiência e a eficácia organizacionais.

Se souberem como solicitar e fazer boas promessas, chefes e subordinados podem minimizar esse tipo de atrito. Melhor ainda, serão capazes de superar desafios de execução com que depararem. Constatamos que pro­messas bem-feitas apresentam as cinco características a seguir.

Boas promessas são públicas

A promessa feita, monito­rada e honrada em público é mais firme — e, logo, mais de­sejável — do que acertos orquestrados a portas fechadas. Quando faz uma promessa em público, perante colegas e superiores, a pessoa não pode esquecer convenientemente o que se comprometeu a fazer, lembrar de apenas certas condições da promessa ou ignorar totalmente um compro­misso incômodo. O mais provável é que – nem queira agir assim: a psicologia descobriu que a maioria das pessoas procura fazer jus àquilo que declarou em público. Afinal, é sua imagem como indivíduo competente e digno de confiança que está em jogo.

Um bom exemplo do poder da promessa pública é o do Royal Bank of Scotland. Na última década, o RBS foi de segundo maior banco da Escócia a um dos dez maiores do mundo. En­trou na primeira divisão em 2000 com a compra do NatWest, banco da Inglaterra de porte três vezes maior. O RBS não fez a primeira nem a maior oferta pelo NatWest, mas ganhou a dis­puta por prometer melhorar o desempenho operacional do banco inglês. Não soltou decla­rações vagas sobre sinergias es­peradas ou eficiências de escala; o que seus dirigentes fizeram foi prometer, em público, empreen­der 154 iniciativas específicas que, juntas, elevariam o faturamento em £ 390 milhões e derrubariam os custos em £ 1,2 bilhão. O RBS prometeu, ainda, que seus gerentes assumiriam pes­soalmente a responsabilidade pela execução dessas iniciativas.

Uma promessa feita em pú­blico deve permanecer pública enquanto durar o compromis­so. Todo ano, executivos da bra­sileira AmBev prometem publicamente atingir cinco metas individuais, todas ligadas aos objetivos gerais da empresa. Assumem o compromisso de atingir metas estabelecidas para elevar as margens, di­gamos, ou melhorar o nível de atendimento, ou ainda cortar custos. O desempenho de cada gestor à luz desses objetivos é monitorado semana a semana, com os dados divulgados na empresa para quem quiser ver. A cultura de transparência e execução disso surgida ajudou a alçar a AmBev de segunda maior cervejaria do Brasil ao posto de maior do mundo (em volume) por meio da InBev, sua joint venture com a belga Interbrew.

Boas promessas são ativas

Em muitas organizações o cliente lança pedidos sobre o provedor como se fosse um entregador de jornal arremessando a publicação na porta do assinante. O provedor recebe os pedidos, coloca todos em uma pilha e volta ao trabalho. Um pedido desses rara­mente inspira boas promessas. Como vimos antes, negociar um compromisso deve ser um processo ativo, colaborativo.

É inevitável o surgimento de mal-entendidos quando provedores e clientes vêm de disciplinas, divisões de negó­cios, organizações ou nações distintas, ou quando estão en­volvidos em uma iniciativa inédita. Para piorar, quando uma promessa organizacional é quebrada, é comum uma parte achar que a outra agiu de má-fé. Gerentes de divi­sões de negócios reclamam dos “idiotas” da TI, enquanto engenheiros de software se queixam de gerentes que não sabem o que querem. Ninguém recebe o benefício da dú­vida e toda falha na comunicação é interpretada como mais um indício da má intenção. Essa espiral descendente de desconfiança envenena as relações e prejudica o desempenho. Em tais situações, uma boa discussão pode expor as premissas distintas de clientes e provedores.

Em muitas organizações a negociação ativa de uma pro­messa vira uma exploração de afirmações e cenários diversos, envolvendo todos em uma ciranda arrastada de ré­plicas e questões capciosas feitas para demonstrar a inte­ligência de quem pergunta, e não para se chegar a uma boa promessa. A discussão em geral começa de modo pro­dutivo — mas emperra quando os envolvidos buscam to­tal certeza antes de selar um acordo. Nessa cilada havia caído uma série de altos executivos de uma empresa de biotecnologia. A cúpula era formada de cientistas brilhan­tes que passavam todo o tempo tentando provar que ti­nham razão. O debate era ilustrado e erudito, mas no final não se fazia nada.

Um diálogo ativo deve incluir propostas, contrapropos­tas, compromissos e recusas, e não declarações infindáveis sobre o estado da natureza. Na empresa de biotecnolo­gia citada, os executivos por fim concordaram em fazer pedidos claros uns aos outros e fornecer somente as infor­mações de fundo necessárias para substanciar tais pedidos para possíveis provedores (um dos executivos foi encar­regado de interromper quem estivesse exagerando nas explicações). O provedor potencial tinha direito a duas rodadas de perguntas para esclarecimentos. Tinha, então, 48 horas para voltar ao cliente com uma negativa, o com­promisso de agir ou uma contraproposta. Em questão de semanas as discussões da equipe não eram mais debates infindáveis sobre a realidade — e sim pedidos claros de ação e promessas de execução.

Boas promessas são voluntárias

Em muitas organi­zações a pessoa se sente no dever de atender a todo e qualquer pedido para ser vista como integrada à equi­pe, para agradar o chefe ou para não parecer babaca. No passado, por exemplo, o pessoal da General Motors usava e abusava de um certo “GM nod” — um “sim” cortês a todo pedido. Só que quando a resposta a todo pedido é sim, isso significa o quê? Pode significar “sim” — mas pode significar “não”. Ou “Está na hora do almoço?”, ou “Estou vivo”.

As promessas mais efetivas não são obtidas na força; são voluntárias. O provedor tem alternativas viáveis, não precisa dizer apenas sim. Um contrato firmado sob coação não tem efeito perante a lei. Na mesma veia, a psicologia descobriu que o indivíduo se sente pouco responsável, pessoalmente, por promessas feitas sob ameaça (embora, por temor, possa aceitá-las). Já quando a promessa é feita de livre e espontânea vontade a pessoa se sente profunda­mente obrigada a honrá-la.

Embora um provedor não deva ser obrigado a atender a todo pedido, tampouco é possível permitir que não fa­ça promessas. Em vez de dizer automaticamente não, o provedor pode responder ao pedido de um cliente com uma contraproposta. Algo como: “O que você está pedin­do não é possível, o que posso fazer é o seguinte”. Um sim irrefletido e um não automático são respostas passivas ao pedido de um cliente. Já a contraproposta indica o interesse ativo do provedor e seu envolvimento voluntário para ajudar o cliente a triunfar.

Altos executivos devem, portanto, dar ao provedor espaço para rejeitar o pedido do cliente ou fazer uma contraproposta. Um executivo em uma empresa de tec­nologia da informação com a qual trabalhamos deu aos subordinados diretos um jogo de cartões — a maioria com as palavras “sim” ou “contraproposta” estampadas; três com a palavra “não”. Todo subordinado podia usar esses cartões para rejeitar três pedidos por trimestre, desde que desse publicamente uma explicação clara para a recusa.

Naturalmente, o gerente deve estar ciente de que cer­tos integrantes da equipe talvez abusarão de uma aborda­gem de adesão voluntária a promessas. Manter gente avessa a compromissos na equipe derruba o poder da pro­messa para todos os demais.

Boas promessas são explícitas

Clientes e provedores devem deixar bem claro quem fará o que para quem, e até quando. A necessidade de negociação explícita é maior em situações nas quais uma nova parte substitui uma antiga, o pessoal da empresa é culturalmente diverso ou um constructo abstrato (otimização ou inovação, por exemplo) dá lugar a distintas interpretações. Promessas implícitas são estabelecidas com rapidez e facilidade, mas não raro resultam em mal-entendidos.

Cliente e provedor devem ser explícitos em relação à promessa durante todo o ciclo de vida desta. O pedido deve ser claro desde o começo, relatórios de progresso devem refletir fielmente como a promessa vem sendo exe­cutada e o sucesso (ou fracasso) deve ser descrito em de­talhes assim que concluída a execução — e não posteriormente, em uma avaliação trimestral de desempenho ou no feedback de 360 graus anual.

Uma grande joint venture de engenharia hidrelétrica que assessoramos entendeu a necessidade de clareza nas promessas organizacionais e criou um sistema para garan­tir que as linhas de comunicação entre clientes e provedores permanecessem abertas. Desde sua criação, em 2000, a Voith Siemens Hydro Power Generation enfrentou novatas chinesas e indianas na ponta inferior do mercado e adver­sárias estabelecidas, incluindo GE a Alstom, na ponta supe­rior. A Voith Siemens decidiu que a melhor maneira de competir seria oferecer à clientela soluções integradas — usinas inteiras, incluindo turbinas, geradores e outros com­ponentes. Para que a estratégia desse certo, porém, os ge­rentes teriam de reconceber o modo como funcionários de disciplinas, regiões e departamentos distintos coordenavam suas atividades. O presidente, Hubert Lienhard, lançou junto com a equipe um programa para melhorar a qualida­de dos compromissos assumidos pelo pessoal. Engenheiros de disciplinas diversas, por exemplo, criaram e dissemina­ram uma série de listagens e formulários padronizados para nortear pedidos e promessas. Cada lista trazia uma meia dúzia de aspectos de todo pedido ou promessa que deviam ser explícitos para ambas as partes. Isso incluía nomes, datas, justificativa para o pedido, capacitação exigi­da para o cumprimento da promessa e por aí vai. Os enge­nheiros estabeleceram, ainda, interrupções periódicas do projeto — durante as quais os coordenadores do projeto voltavam a suas listas para garantir que clientes e provedo­res seguissem com uma noção idêntica sobre pedidos, pro­messas e contrapropostas.

Uma promessa explícita promove a coordenação e a exe­cução por toda a organização. Mantém os clientes satisfei­tos e os provedores na linha. Isso não significa que os termos de uma promessa estão gravados em pedra; podem e vão evoluir com a alteração das circunstâncias, a mu­dança de prioridades ou o surgimento de novas infor­mações. Renegociar promessas pode não ser agradável — pode ser arriscado, demorado, consumir altos recursos. Mas é vital. Clientes e provedores devem ter escopo para recalibrar e, com isso, agarrar novas oportunidades de negócios.

A californiana Onset Ventures já cultivou mais de cem start-ups de tecnologia em estágio inicial de 1984 para cá. Quase 80% delas (ante à média de cerca de 20% no setor) passaram para rodadas superiores de financiamento. Assim como a maioria das firmas de capital de risco, a Onset arma o financiamento em rodadas. No começo de cada uma, o empreendedor e a Onset negociam um pu­nhado de metas explícitas a serem atingidas antes do aces­so à rodada seguinte — criar a versão beta do produto, conquistar cinco clientes de referência, sondar cem clien­tes potenciais para aferir a demanda. As promessas são in­violáveis na rodada em pauta, mas podem mudar (e mudam) em rodadas subsequentes. A cada rodada o empreendedor e a firma de capital de risco reavaliam a si­tuação e chegam a novas promessas para contemplar mu­danças nas necessidades do negócio.

Boas promessas são baseadas em missões

É comum o cliente solicitar uma promessa do provedor sem explicar por que o pedido é importante. Com isso, o provedor acaba concluindo que o pedido não é crítico ou que o cliente não considera ele, provedor, importante o bastante para mere­cer uma explicação ou inteligente o suficiente para en­tendê-la. Seja qual for o caso, o final não será feliz. A pro­messa mais efetiva é fundada em uma missão — ou seja, o cliente explica a lógica por trás do pedido e dedica um tempo a garantir que o provedor entenda a missão. Talvez seja complicado explicar o papel de uma divisão na estraté­gia da empresa ou o lugar ocupado por um pedido específi­co nessa divisão. Mas, se o provedor entende por que sua promessa é relevante, é mais provável que persista na exe­cução mesmo se topar com demandas conflitantes e entra­ves imprevistos. Pode, ainda, usar de criatividade para contemplar o desejo subjacente do cliente, em vez de respeitar cegamente a letra expressa do pedido.

O Marine Corps (corpo de fuzileiros navais) americano usa o que chama de pedidos baseados em missões. Um pe­dido desses expressa claramente o que o oficial no coman­do quer, e por quê — deixando ao oficial subordinado mais próximo da situação em campo a decisão sobre o método de implementação. Cada pedido traz uma expli­cação — que é conhecida como intenção do comandante e diz por que o objetivo é importante para o oficial no co­mando e para o superior deste. Um líder empresarial pode empregar disciplina similar ao explicar a provedores por que um objetivo importa para ele. E, para avaliar se o provedor entende e endossa a justificava geral do pedido, pode pedir que este expresse, com suas próprias palavras, por que o pedido é importante.

A promessa é a unidade fundamental da interação em em­presas. Coordena a atividade organizacional e nutre a paixão de funcionários, clientes, fornecedores e outros interessados. Embora seja a argamassa da organização, é tão frágil quanto crucial. Visões de mundo e metas divergentes de indivíduos

provocam o constante desgaste de promessas, enquanto contingências inesperadas podem destroçar um pacto precário. Logo, o líder deve tecer e administrar sua rede de promessas com muito carinho — incentivando o diálogo iterativo para assegurar que todo compromisso seja honrado de modo confiável. Se agir assim, vai acentuar a coordenação e a coope­ração entre colegas, atingir a agilidade necessária para a ex­ploração de novas oportunidades de negócios e explorar a energia empreendedora do pessoal.

Sem isso, vai perder para rivais que seguirem esses preceitos.

Teoria dos atos de fala, em poucas palavras

A maioria dos executivos prefere fazer a falar, mas passa entre dois terços e três quartos do dia em discussões formais ou informais. Como executar o trabalho com meras palavras? Segundo a teoria dos atos de fala — ramo da filosofia da lin­guagem que explora como o indivíduo usa palavras para coordenar a ação — falar é fazer.

Durante séculos a filosofia encarou a linguagem como um instrumento de descrição da realidade externa. Um enunciado como “Está chovendo” era considerado verda­deiro ou falso na medida em que correspondia ou não às condições no mundo real. Na década de 1950, porém, o fi­lósofo John L. Austin, de Oxford, afirmou que muitos enun­ciados são uma forma de agir, e não uma descrição da realidade. Quando um comandante militar dá uma ordem ou um fornecedor promete prestar um determinado ser­viço, esse indivíduo não está descrevendo uma realidade, mas modificando-a com a fala. Segundo Austin, a fala sem­pre se enquadra em um amplo espectro que vai de enun­ciados puramente descritivos, como equações científicas, a enunciados puramente ativos, como o do padre ao declarar um casal marido e mulher.

Professor de filosofia da University of Califórnia, John Searle sugeriu posteriormente uma taxonomia dos atos de fala baseada na função de cada tipo de enunciado no agir. Um ato de fala comissivo compromete o locutor com um curso futuro de ação e inclui, além de promessas, propos­tas (Se você aceitar, farei…) e contrapropostas (Não posso fazer isso, mas posso…). Atos diretivos tentam induzir o outro a fazer algo; incluem súplicas, pedidos e ordens. Atos declarativos são enunciados que mudam o estado de coi­sas no mundo, como quando um chefe demite alguém. Um ato expressivo leva o locutor a expressar certos sentimen­tos em relação a uma determinada situação, como ao pedir desculpas por ter feito algo. Um ato de fala assertivo com­promete o locutor com uma certa verdade e implica ações futuras com ela condizentes.

Aluno de Searle, Fernando Flores afirmou que o grosso da conversação em empresas é sabotado pela tentativa de se chegar a verdades absolutas que todos aceitem e que produzam um programa claro, seguido por todos. Flores su­gere que, assim como filósofos, muitos gestores se deixa­ram seduzir pela crença de que falar é descrever, e não fazer. Pedidos e promessas são as unidades básicas da coordenação em organizações comerciais, e enunciados as­sertivos (ou representativos) deveriam ser usados basica­mente para esclarecer tais pedidos e promessas.

De forma consciente ou não, o gestor cria (através da fala) uma rede intrincada de compromissos, pedidos, afir­mações e declarações que influenciam o modo como o pessoal na organização age.

Aplicação da gestão baseada em promessas

Nossa pesquisa sobre compromissos sugere que o trabalho na organização emperra quando as pessoas deixam de fazer ou cumprir promessas. Conforme indicado na tabela abaixo, ao cultivar e coordenar promessas de modo sistemático, o gerente pode colocar projetos e iniciativas vitais novamente em marcha.

Obstáculos à realização do trabalho: Silos organizacionais impedem coordenação.

Causas: Pedidos e promessas são honrados dentro da divisão, mas considerados opcionais quando ligados a outras divisões. Pedidos e promessas ligados a outras divisões são vistos como disputa política por poder, gerando desconfiança.

Soluções: Monitorar publicamente progresso de pedidos e promessas feitos entre divisões. Ensinar pessoal a fazer e honrar pedidos por toda a organização e a administrar suas redes de promessas. Fazer (e cumprir com rigor) uma série de promessas pequenas, mas altamente visíveis, para restabelecer a confiança. Vincular expressamente pedidos e promessas a uma missão maior respaldada por todos.

Obstáculos à realização do trabalho: Funcionários não estão engajados.

Causas: Indivíduo não enxerga elo entre estratégia da empresa e as próprias atividades. Indivíduo se sente impedido de recusar ou renegociar pedidos e acaba prometendo mais do que pode.

Soluções: Garantir que todos entendam como suas promessas respaldam a missão maior e as prioridades da empresa. Celebrar publicamente a promessa cumprida. Dar ao pessoal poder para recusar pedidos desmedidos, fazer contrapropostas e renegociar promessas quando circunstâncias mudarem.

Obstáculos à realização do trabalho: Atribuição de responsabilidades não é clara na organização.

Causas: Promessas são feitas a portas fechadas, progresso não é monitorado abertamente e gerentes se recusam a mostrar insatisfação em público.

Soluções: Garantir que promessas sejam feitas publicamente, monitorar progresso rumo a cumprimento de modo transparente e declarar publicamente satisfação (ou não) com resultados.

Obstáculos à realização do trabalho: Falta agilidade à organização.

Causas: Gerentes demoram a explorar novas oportunidades, pois tentam atingir total consenso em sua avaliação e buscam soluções perfeitas.

Soluções: Dar ao pessoal poder para buscar provedores certos dentro ou fora da organização e, com isso, garantir recursos exigidos para exploração de novas oportunidades. Adotar um protótipo “bom o bastante” e aprimorá-lo com o tempo por meio do constante diálogo, renegociando promessas à medida que circunstâncias e prioridades mudem. Focar o cumprimento de promessas, e não demonstrações burocráticas de conformidade.

Obstáculos à realização do trabalho: Partes interessadas não acreditam na palavra de executivos.

Causas: Clientes, investidores, ONGs, autoridades e outras partes exigem mecanismos complicados de monitoramento e se recusam a cooperar.

Soluções: Fazer promessas a partes interessadas em público; chamar terceiros dotados de credibilidade para monitorar progresso da execução. Fazer (e cumprir com rigor) uma série de promessas pequenas, mas altamente visíveis, para restabelecer a confiança.

Obstáculos à realização do trabalho: Organização está presa ao status quo.

Causas: Altos executivos articulam nova estratégia, mas a empresa segue agindo como sempre. Em outro cenário, a empresa age bem durante uma crise, mas retoma a velha rotina uma vez superada a dificuldade.

Soluções: Reconhecer que alteração na estratégia requer novas promessas. Articular promessas necessárias à execução da nova estratégia e, na ausência de papéis de cliente e provedor, defini-los. Divulgar pesadamente cumprimento de novas promessas por provedores.

Fonte: HARVARD BUSINESS REVIEW – Abril/2010 – Pág. 52 a 60.

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