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O varejo brasileiro já descobriu a importância da prestação de serviços – mas ainda precisa aprender muito a respeito

A loja da Casas Bahia localizada na praça ramos de Azevedo, no centro de São Paulo, é uma espécie de labo­ratório para a maior rede de móveis e eletroeletrônicos do país. Lá são testados conceitos que depois são expandidos — ou não — às outras 546 lojas do grupo espalhadas por todo o Brasil. Há dois anos, a Casas Bahia vem utili­zando essa unidade para testar com mais força uma pre­ferência crescente dos clientes: a prestação de serviços. Quem passeia na loja da praça Ramos, onde por décadas funcionou a antiga loja de depar­tamentos Mappin, vê pontos-de-venda de produtos como pães de queijo, chocolates, sorvetes, jóias, passagens aéreas, livros e até óculos — todos em parceria com empresas especializadas nesses mercados. “Ao facilitar­mos a vida do cliente, ele fica mais tempo dentro da loja e às vezes até compra alguma coisa por impulso”, diz Michael Klein, diretor-geral da Casas Bahia. A iniciativa de Klein é o maior exemplo do esforço do va­rejo brasileiro para seguir uma tendência mundial: aliar a oferta de servi­ços à venda tradicional de produtos. Com essa estratégia, cadeias do mun­do todo estão conquistando maior fidelidade do consumidor, elevando as receitas e, muitas vezes, alcançando a liderança em segmentos que nada têm a ver com seu negócio principal. No Brasil, salvo honrosas exceções, o quadro é bem diferente. Uma pesquisa inédita da consultoria Gouvêa de Souza & MD revela que as redes brasileiras estão atrasadas — e basi­camente por uma razão. Elas desconhecem aquilo que o público de fato quer consumir. “Existem lacunas que as empresas ainda não identifica­ram e que, em pouco tempo, poderão significar a diferença entre ser ou não bem-sucedido no segmento de varejo”, diz Marcos Gouvêa de Sou­za, responsável pelo estudo e sócio da consultoria.

Nos últimos anos, os brasileiros têm empenhado uma parcela cada vez maior de sua renda no consumo de serviços. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geo­grafia e Estatística (IBGE), o consumidor gastava, em 1995, 31% de seus ganhos com serviços diversos. Atualmente, essa parce­la fica em torno de 55% da renda. Em sua pesquisa, a Gouvêa de Souza ouviu 2017 consumidores com idade entre 16 e 69 anos em todo o país e mapeou o que eles mais consumiriam nas lojas. Em linhas gerais, o pesquisador percebeu um desencontro entre aquilo que as lojas oferecem e o que o consumidor realmente deseja. De acor­do com o levantamento, entre os serviços mais esperados estão processamento digi­tal de imagens, compra de ingressos, assistência técnica de produtos com defeito e corte de cabelo. Os servi­ços mais comuns nos varejistas, como se­guros e linhas de crédito, não apresentam uma demanda tão expressiva. Segundo a pesquisa, menos da metade dos entrevis­tados demonstra interesse por eles. “As operações financeiras são importantes, mas já não são vistas pela clientela como um serviço diferenciado. As pessoas querem transformar essa experiência em algo mui­to parecido a um passeio no shopping”, afirma Gouvêa de Souza.

A dificuldade está em fazer isso de ma­neira rentável para a empresa e, ao mes­mo tempo, atrativa para o cliente. Poucas redes têm sido tão bem-sucedidas em en­contrar esse ponto de equilíbrio quanto o Pão de Açúcar. Diferentemente da Casas Bahia, o Pão de Açúcar decidiu assumir a gestão dos serviços oferecidos ao público em vez de terceirizá-los. Nas lojas da re­de, os clientes podem pagar contas, reve­lar fotos e ainda encomendar um jantar completo para comemorações especiais. Algumas unidades também mantêm pet shops e farmácias operadas pelo próprio grupo — que se diferenciam das drogarias tradicionais por terem foco em produtos fitoterápicos, homeopáticos e cosméticos importados. Dá muito trabalho ampliar o leque de ofertas ao consumidor, ainda mais mantendo essas operações sob administra­ção própria. Mas, segundo os executivos do Pão de Açúcar, a estratégia vem dando certo. O número de clientes que conso­mem serviços nas lojas do grupo cresceu 22% em apenas um ano. Além disso, o cliente que utiliza serviços gasta em mé­dia 20% mais do que os outros. “Estamos sempre estudando novidades que possam atrair um maior número de consumidores para nossas lojas”, diz Cláudia Pagnano. diretora executiva do Pão de Açúcar.

As exceções apenas confirmam a percepção de que os varejistas brasileiros aproveitam pouco as oportunidades no setor de serviços. Na Casas Bahia, os ser­viços — incluindo os financeiros — res­pondem por cerca de 10% do lucro da em­presa. Na rede de supermercados inglesa Tesco, apenas os serviços como linhas de crédito e seguros já correspondem a mais de 22% dos ganhos. Sua mais nova apos­ta na área são os serviços de telefonia ce­lular. Criada em 2003. a divisão Tesco Te­lecom opera em parceria com a operado­ra O2. Juntas, vendem planos pré-pagos de celular. A operadora cuida da parte técnica e a Tesco fica responsável por áreas como venda, cobrança e marketing. A as­sociação está prestes a tornar-se a segun­da maior vendedora de planos pré-pagos de celular da Inglaterra. “Na Tesco e em outras grandes varejistas do mundo, os serviços são tão importantes que dei­xaram de ser uma renda extra ou chamariz de con­sumidores para tornar-se um negócio”, diz Gouvêa de Souza.

Ao agregar um novo ti­po de serviço, as cadeias de varejo têm a chance de multiplicar as receitas de uma maneira drástica — especial­mente se o serviço tiver clara si­nergia com o que já é feito por essas empresas. Nesse cenário, a americana Best Buy, especia­lizada na venda de eletroeletrônicos, deu um notável exemplo de como aproveitar essa oportunidade. Há quatro anos, a Best Buy ocupava a segunda colocação no ranking de companhias especializadas no va­rejo de eletrônicos nos Estados Unidos. Para mudar esse cenário, seus acionistas resolveram comprar a Geek Squad, com­panhia de suporte técnico para reparo e manutenção de computadores dos clien­tes. A ideia era vender os produtos e, ao mesmo tempo, proporcionar à clientela a segurança de que a com­pra teria assistência técni­ca mesmo depois do fim da garantia. Desde então, foram mais de 5 milhões de atendimentos e a con­quista da liderança por lar­ga margem — hoje, a Best Buy é quase três vezes maior que sua principal concorrente.

Existem alguns fatores que favorecem a expansão das redes de varejo rumo à oferta de serviços. Um dos principais é que essas empresas desfrutam de um alto grau de confiança da clientela. Em tese, isso dá a essas redes a possibilidade de oferecer serviços escoradas na confiabilidade de suas marcas. Nos Estados Unidos, o Wal-Mart aproveitou-se dessa formidável condição para lucrar com uma atividade incomum (para uma rede de va­rejo, claro): atendimento médico para ca­sos de pequena complexidade. Por preços que variam de 20 a 65 dólares, o clien­te/paciente faz exames clínicos, toma va­cinas e se trata de problemas como gripes ou pequenos acidentes domésticos — e,
se for o caso, compra o remédio na farmá­cia ao lado. Tudo dentro do ambiente das lojas. Hoje existem 76 clínicas nas unida­des do Wal-Mart, e a novidade deu tão cer­to que a meta é abrir 400 novos postos nos próximos três anos. Os exemplos do Wal-Mart, da Tesco e da Best Buy provam que o varejo brasileiro ainda pode evoluir mui­to na oferta de serviçes, mas antes preci­sa aprender mais sobre as necessidades e as vontades de seus clientes.

Fonte: REVISTA EXAME – 20/06/2007 – Pág. 64 a 66.

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